O caso de Maria do Socorro se insere em um contexto estrutural de crise da saúde pública no Rio Grande do Norte, especialmente no interior do estado. Mossoró é o principal polo de atendimento da região Oeste, e o Hospital Regional Tarcísio Maia (HRTM) concentra a maior parte da demanda por serviços de média e alta complexidade, incluindo leitos de UTI. No entanto, a capacidade instalada do hospital não acompanha o volume de pacientes encaminhados diariamente pelas UPAs e hospitais menores da região.
As Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), como a do bairro São Manoel, foram concebidas para atendimentos de urgência e estabilização temporária, não para internações prolongadas ou tratamentos complexos como hemodiálise e terapia intensiva. Quando faltam leitos hospitalares, essas unidades acabam funcionando como “salas de espera”, o que expõe pacientes graves a riscos elevados e sobrecarrega profissionais e estruturas inadequadas para esse nível de cuidado.
A situação se agrava pela escassez histórica de leitos de UTI no estado, problema já apontado por órgãos de controle, sindicatos da saúde e pelo próprio Ministério Público. Em períodos de maior demanda — seja por surtos de doenças, envelhecimento da população ou agravamento de doenças crônicas — o sistema entra em colapso, resultando em filas invisíveis por leitos e transferências que não ocorrem a tempo.
Casos como o de Maria do Socorro revelam não apenas uma falha pontual, mas um problema sistêmico: falta de investimentos contínuos, deficiência no planejamento da rede hospitalar, carência de profissionais especializados e ausência de alternativas regionais para aliviar a pressão sobre o HRTM. O desfecho trágico reforça a percepção de que a crise na saúde pública do RN deixou de ser episódica e passou a ser uma condição permanente, com impacto direto sobre o direito à vida e ao atendimento digno da população.



